quinta-feira, 1 de outubro de 2009
Diferenças radicais (no sentido etimológico)
Enzo Bianchi (aqui à esquerda) esteve ontem na Universidade Católica para fazer uma conferência sobre "Ética Partilhada", tema do seu livro mais recentemente publicado entre nós, e que eu recomendo vivamente: Para uma ética partilhada, edições Pedra Angular.
Aí se encontra uma reflexão com a qual me confrontei desde o início da minha actividade como docente de Literatura e Cultura Americanas, a da distinção, no seio do cristianismo, entre uma cultura protestante e uma católica. Algo de essencial para entendermos a realidade diferente a estudar. Eis um passo:
"... após Constantino, o cristianismo foi o grande suporte ético-cultural de toda a sociedade ocidental. O êxito recente destes processos é constituído pela civil religion bastante difundida nas Igrejas de matriz evangélica nos Estados Unidos, mas estranho à grande tradição católica: a religião é olhada como factor útil a uma sociedade que, aparentemente, está cada vez mais fragmentária e esmorecida; serve quase de 'verniz', fornecendo à sociedade um 'suplemento de alma' que esta última, por si só, a mesma não pode proporcionar, oferecendo os valores de que tem necessidade para manter ordem e equilíbrio...
Estes fenómenos - hoje, comprendêmo-lo bem - são o resultado de um cristianismo expresso sobretudo como instituição eclesiástica, como religião cívica. Talvez a Igreja, nesta condição, consiga potenciar a sua influência na sociedade, mas seria decerto uma Igreja incapaz de assumir posições proféticas e corajosas, e mais incapaz ainda de transmitir o evangelho e a fé. Diga-se com clareza: a mensagem evangélica pretende ter princípios verdadeiramente não negociáveis, irrenunciáveis, como o perdão, o amor do inimigo, a defesa dos mais fracos, a política da paz. Nisto consiste a 'a-normalidade' política do cristianismo, que surge onde a mensagem do evangelho se opõe a toda a necessitas de poder humano, pelo que a relação entre política e cristianismo nunca pode ser estática nem resolvida de uma vez por todas. Mais ainda, os cristãos, apoiados na sua fé, são capazes de uma objecção de consciência às leis do Estado: esquece-se, com demasiada facilidade, que os cristãos, nos primeiros três séculos, praticaram a objecção de consciência ao serviço militar; excepto depois de serem integrados como religião do Império; esta instância tornou-se viva só a partir da segunda metade do século passado..." (pp.15-16)
Boas leituras!
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