quinta-feira, 16 de novembro de 2017

Sabedoria, segundo Livro de Sabedoria 7

Com o precioso auxílio de Veronese.
Na Sabedoria há um espírito inteligente, santo, único, multiforme, subtil, veloz, perspicaz, sem mancha; um espírito lúcido, inalterável, amigo do bem; penetrante, irreprimível, benfazejo, amigo dos homens; firme, seguro, sereno; ele tudo pode, tudo abrange e penetra todos os espíritos, os mais inteligentes, mais puros e mais subtis. A Sabedoria é mais ágil que todo o movimento, atravessa e penetra tudo, graças à sua pureza.

segunda-feira, 13 de novembro de 2017

Uma obra acabada de sair

Refere Woody Allen num filme (não me lembro qual) que o seu psicanalista era um freudiano ortodoxo. Significava isto que, mesmo que ele se suicidasse, tinha que continuar a pagar as sessões. Ainda que radicado em Freud, Orlando Fialho, um dos mais reputados psicanalistas da nossa praça, está bem longe do analista de Allen. A sua obra acabada de vir a lume, com a chancela da Colibri, tem por título Psicanálise - Sujeito e objecto na cura analítica, e foi apresentada em Lisboa no sábado passado ao final da tarde (uma alegria rever Orlando Fialho trinta e tal anos depois!). A obra reúne um conjunto de conferências realizadas ao longo do tempo, o que não significa uma ausência de coerência e de unidade no percurso analítico, com continuados regressos a Ogden, Bion e a Winnnicott (e a Freud, claro), passando por Alberto Caeiro e Monet. Aprecio, entre outras coisas, o modo como o analista se revela na sua fragilidade do encontro com o outro, e a consequente convocação de conceitos como "entre" e "inter-subjectividade", "resto", "caos" e "vestígio". Porque já o li, recomendo a quem reconhece que pode aplicar-se a si próprio o comentário de Bion: Eu esforço-me por ver outra coisa, por me abrir a outra coisa - aos vestígios, aos vestígios mentais. (...) O que é evidente, é evidente, não há nada mais a dizer. O analista deve libertar-se das suas recordações e dos seus desejos, de forma a poder abrir-se ao presente. A psicanálise dá a impressão - correndo o risco de nos induzir em erro - que o que importa é o passado, na medida em que nos faz acreditar que o importante em psicanálise é o passado. No entanto, o passado não é importante, porque relativamente a ele não podemos fazer nada. As únicas coisas às quais podemos ter acesso são os restos, os vestígios do passado, os vestígios de estados de espírito do passado ou de componentes arcaicas do nosso físico... (Fialho, 2017: 59-60) Enfim, uma reflexão que pode ajudar-nos a compreender(-nos)... a nós que "vivemos permanentemente num caos psíquico" (idem, 59).

«No meio da noite»

Escreve Santo Agostinho (354-430) no Sermão 93, a propósito de Evangelho de Mateus 25,1-13: As dez virgens quiseram, todas elas, ir ao encontro do esposo. Que significa ir ao encontro do esposo? É ir com o coração, é viver na expetativa da sua chegada. Mas ele tardava a vir e elas adormeceram. [...] Que significa isto? Há um sono a que ninguém pode escapar. Recordai aquelas palavras do apóstolo Paulo: «Não queremos, irmão, que ignoreis o que o que diz respeito aos que dormem» (1Tes 4,12), isto é, aos que morreram. [...] Elas adormeceram todas. Pensais que a virgem prudente pode escapar à morte? Não, sejam elas prudentes ou insensatas, todas têm de passar pelo sono da morte. [...] «No meio da noite ouviu-se um brado». Que quer isto dizer? Que é quando ninguém pensa, quando ninguém espera... Ele virá quando menos pensarmos nisso. Porque vem Ele assim? Porque «não vos compete conhecer o tempo ou a hora que o Pai fixou na sua autoridade» (At 1,7). «O dia do Senhor», diz o apóstolo Paulo, «virá como um ladrão em plena noite» (1Tes 5,3). Vigiai, pois, durante a noite, para não serdes surpreendidos pelo ladrão. Porque, que queirais quer não, o sono da morte virá necessariamente. [...] E, no entanto, isso só acontecerá quando se ouvir um grito no meio da noite. Que grito é este? É aquele de que o apóstolo Paulo diz: «Num instante, num piscar de olhos, ao som da última trombeta. Porque a trombeta soará e os mortos ressuscitarão incorruptíveis e nós seremos transformados» (1Cor 15,52). Após aquele grito que ressoou no meio da noite: «Aí vem o esposo», que acontecerá? «Levantaram-se todas».

quarta-feira, 1 de novembro de 2017

Pessoa nos caminhos de Belas

para visitar a mãe do padrasto, internada numa casa de saúde local: "Sunday, 27th May, 1906 A horrible warm day. Had to go to Belas. Awful in the train, especially in the tunnel on returning. I thought I should die of suffocation. Read nothing: absolutely impossible."

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

A fadiga dos passos

"Da abertura escura do interior deformado do calçado, a fadiga dos passos do trabalho olha-nos fixamente. No peso sólido, maciço, dos sapatos está retida a dureza da marcha lenta pelos sulcos que longamente se estendem, sempre iguais, pelo campo, sobre o qual perdura um vento agreste, No couro está [a marca] da humidade e da saturação do solo. Sob as solas, insinua-se a solidão do carreiro pelo cair da tarde. O grito mudo da terra vibra nos sapatos, o seu presentear silencioso do trigo que amadurece e o seu recusar-se inexplorado no puis desolado do campo de Inverno. Passa por este utensílio a inquietação sem queixume pela segurança do pão, a alegria sem palavras do acabar por vencer de novo a carestia, o estremecimento da chegada do nascimento e o tremor na ameaça da morte." Martin Heidegger

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Confidenciou-me um amigo

"Com a mãe no Céu, mais lhe pertencemos."

Tom Petty’s Last Song

«Estai [...] preparados»

«Na hora em que não pensais virá o Filho do homem». Jesus diz-lhes isto para que os discípulos fiquem vigilantes, para que estejam sempre preparados. Se lhes diz que virá quando menos O esperam, é porque quer levá-los a praticar a virtude com zelo e sem descanso. É como se lhes dissesse: «Se as pessoas soubessem quando vão morrer, estariam perfeitamente preparadas para esse dia». Mas o momento final da nossa vida é um segredo que escapa a cada homem. É por isso que o Senhor exige duas qualidades ao seu servo: que seja fiel, para que não atribua a si mesmo nada do que pertence ao seu Mestre, e que seja avisado, para administrar convenientemente tudo o que lhe foi confiado. São-nos pois necessárias estas duas qualidades para estarmos preparados para a chegada do Mestre. [...] Porque, como não sabemos qual é o dia do nosso encontro com Ele, dizemos para connosco: «O meu Senhor tarda em vir». O servo fiel e avisado não tem tal pensamento. Ó infeliz, que pensas que o teu Mestre se demora: imaginas que, por isso, Ele não virá? A sua vinda é certa. Porque não estás vigilante à sua espera? Não, o Senhor não está demorado: esse atraso só existe na imaginação do mau servo. [São João Crisóstomo (c. 345-407), presbítero de Antioquia, bispo de Constantinopla, doutor da Igreja Homilia 77 sobre S. Mateus]

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Uma reflexão sobre a Universidade

elaborada por António M. Feijó e Miguel Tamen, a partir de uma experiência concreta, a da criação da licenciatura em Estudos Gerais na Faculdade de Letras de Lisboa. Recomendo vivamente! Só uma nota (aparentemente) à margem mas que, se lerem o livro, verão ser pertinente. Em conversa, há dias,com um amigo que é professor no Instituto Superior Técnico, soube que ele se licenciou no Canadá em Química, com um minor em... Filosofia. Se tivermos igualmente presentes as experiências anglo-saxónicas, constataremos que as propostas feitas por estes colegas, não são tão insólitas quanto podem à partida parecer. Boas leituras!

terça-feira, 10 de outubro de 2017

Dois olhares, pela imagem e pela palavra

ou como dois grandes vultos da nossa tradição cultural viram Lucas 10,38-42 («Marta, Marta, andas inquieta e preocupada com muitas coisas, quando uma só é necessária. Maria escolheu a melhor parte, que não lhe será tirada».): Velásquez e Santo Agostinho. Eis Velásquez:
E agora, algumas linhas do Sermão 104, de Santo Agostinho:Creio que compreendeis que estas duas mulheres, ambas diletas do Senhor, dignas do seu amor e suas discípulas, [...] são a imagem de duas formas de vida: a vida deste mundo e a vida do mundo futuro, a vida de trabalho e a vida de repouso, a vida das preocupações e a vida da bem-aventurança, a vida no tempo e a vida eterna. [...]A vida de Marta é o nosso mundo; a vida de Maria é o mundo que esperamos. Vivamos neste mundo com retidão, para obtermos o outro em plenitude. Que possuímos já dessa vida? [...] Precisamente, neste momento, vivemos de certa maneira essa vida: afastando o trabalho, pondo de parte as preocupações familiares, reuni-vos e escutais. Comportando-vos assim, assemelhais-vos a Maria. Isso torna-se-vos mais fácil do que a mim, que tenho de tomar a palavra. No entanto, o que digo é a Cristo que vou buscá-lo, e este alimento é de Cristo. Porque é o pão comum a todos, e é para isso que vivo em comunhão convosco.

segunda-feira, 2 de outubro de 2017

Os anjos são os nossos pastores

Sob o signo de Wim Wenders, em As asas do desejo, eis o olhar de São João da Cruz sobre os anjos: Os anjos são os nossos pastores; não só levam a Deus as nossas mensagens, como também trazem até nós as mensagens que Deus nos envia. Eles alimentam-nos a alma com doces inspirações e comunicações divinas; sendo bons pastores, protegem-nos e defendem-nos dos lobos, isto é, dos demónios. Com as suas inspirações secretas, os anjos proporcionam à alma um conhecimento mais elevado de Deus; inflamando-a de uma chama mais viva de amor a Ele, chegam até a deixá-la ferida de amor [...]. A luz de Deus ilumina o anjo, penetrando-o com o seu esplendor e inflamando-o com o seu amor, porque o anjo é um espírito puro, completamente disponível para essa participação divina. Ao homem, porém, ilumina-o habitualmente de maneira obscura, dolorosa e penosa, porque o homem é impuro e fraco [...]. Mas quando o homem se torna verdadeiramente espiritual e se deixa transformar pelo amor divino que o purifica, recebe a união e a amorosa iluminação de Deus com uma suavidade semelhante à dos anjos [...]. Lembrai-vos de que é vão, perigoso e funesto exultarmos com algo que não seja um serviço a Deus, e considerai a infelicidade dos anjos que exultaram e se comprazeram com a sua própria beleza e seus próprios dons naturais; pois foi esse o motivo por que alguns deles caíram, privados de toda a beleza, no fundo dos abismos. Boa semana!

segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Herb Ritts

Exposição do artista americano no Centro Cultural de Cascais, a não perder. Um único defeito na organização, a ausência de um aparelho para medir a tensão arterial a pessoas de meia-idade após ser(mos) confrontado(s) com tantos corpos tão bonitos. Como anti-climax, aqui fica uma foto minha junto ao nosso colega William Burroughs, com o fantasma do Salvato Telles de Menezes a tirar a dita.

sexta-feira, 22 de setembro de 2017

Saiu mais um número da revista

Anglo-Saxonica, com uma secção dedicada a Rudiard Kipling, à qual se segue um conjunto de ensaios sobre outros tópicos, entre os quais um meu, dedicado à presença de Emerson da obra do pensador canadiano Charles Taylor. Eis o índice: ARE YOU AS ANGLO AS I AM INDIAN?, de Cristina Baptista; IMPERIALISMO E REPRESENTAÇÕES DO IMPÉRIO EM KIM, DE RUDYARD KIPLING, de Pedro Estácio; TRAVELLING BETWEEN JOURNALISM AND LITERATURE: KIPLING’S ART IN CROSSING FIXED TEXTUAL BORDERS, de Isabel Simões-Ferreira;ORWELL ON KIPLING: AN IMPERIALIST, A GENTLEMAN AND A GREAT ARTIST, de J. Carlos Viana Ferreira; A MAN OF HIS TIME: THE SCIENTIFIC AND POLITICAL GROUNDS FOR KIPLING’S IMPERIALISM, de Carla Larouco Gomes; COULD THEY HAVE BEEN “MASONIC FRIENDS”? RUDYARD KIPLING AND ANNIE BESANT, de Teresa de Ataíde Malafaia; BOARD(ING) SCHOOLS: RUDYARD KIPLING’S YOUNG HEROES, de Patrícia Rodrigues and Teresa-Cláudia Tavares. Seguem-se ESSAYS/ESTUDOS:EMERSON AMONG THE PATHS OF THE MODERN SELF: CHARLES TAYLOR AND THE CONCORD THINKER, de Mário Avelar; BETWEEN HARD COVERS AND THE “CLOUD”: IS A CANON TO BE FOUND?, de Cristina Baptista; NARRATIVE MEDICINE: WHAT DISCOURSE ADDS TO LISTENING, de Maria de Jesus Cabral, Marie-France Mamzer, Christian Hervé, Cecilia Beecher Martins and Rita Charon; e “THE MYTH IN WHICH THE GODS THEMSELVES WERE ALL DESTROYED”: READING A. S. BYATT’S RAGNARÖK: THE END OF THE GODS AND KLAS ÖSTERGREN’S THE HURRICANE PARTY, de Alexandra Cheira. Aqui fica a informação.

Recomendo vivamente

este livro de ensaios de Adam Phillips que acabo de ler, e que dá pelo nome de In Writing. Este é o olhar de um psicanalista que, dialogando com as diferentes tradições emergentes de Freud, medita sobre a singularidade do solo anglo-saxónico neste âmbito. É estimulante a revisitação que nos propõe de Emerson, de Lear e de Eliot, entre muitos outros. Confesso que não regressava há muito tempo à sensibilidade psicanalítica. Mas Phillips, com a sua irreverência teórica, pôs-me a reflectir sobre ambiguidades que, apesar de tudo, merecem ser revisitadas.

«Ele levantou-se e seguiu Jesus.». Evangelho segundo S. Mateus 9,9-13.

"Naquele tempo, Jesus ia a passar, quando viu um homem chamado Mateus, sentado no posto de cobrança dos impostos, e disse-lhe: «Segue-Me». Ele levantou-se e seguiu Jesus." Reflecte sobre este passo Bento XVI na Audiência geral de 30/08/06: «Levantou-se e seguiu Jesus». A concisão da frase põe claramente em evidência a prontidão com que Mateus respondeu à chamada. Para ele, tal significava tudo abandonar, sobretudo aquilo que lhe garantia uma fonte segura de rendimentos, embora fosse desonrosa e muitas vezes injusta. Mateus compreendeu que a intimidade com Jesus o impedia de manter uma actividade desaprovada por Deus. Facilmente se tira daqui uma lição para o presente: também hoje é inadmissível o apego a coisas incompatíveis com a caminhada de seguir Jesus, como é o caso das riquezas desonestas. Ele próprio o disse sem rodeios: «Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que possuis, dá-o aos pobres e terás um tesouro nos céus. Depois vem e segue-Me» (Mt,19,21). Foi o que fez Mateus: «Levantou-se e seguiu Jesus». Neste «levantou-se», conseguimos ler um nítido repúdio pela situação de pecado e simultaneamente a adesão consciente a uma existência nova, recta, em comunhão com Jesus. Recordemos que a tradição da Igreja atribui unanimemente a Mateus a paternidade do primeiro Evangelho. Já Papias, bispo de Hierápoles, na Frígia, o tinha dito, cerca do ano 130: «Mateus verteu as palavras [do Senhor] em língua hebraica, e cada um as interpretou como podia» (Eusébio de Cesareia, «Hist. Ecl.» III, 39, 16). O historiador Eusébio acrescenta esta informação: «Mateus, que primeiro pregara entre os judeus, quando a certa altura decidiu ir também evangelizar outros povos, escreveu na língua materna o Evangelho que anunciava; procurou deste modo recompensar aqueles de quem se separava, substituindo pela escrita o que perdiam com a sua partida» (III, 24, 6). Já não possuímos o Evangelho escrito por Mateus em hebraico ou aramaico, mas no Evangelho grego que chegou até nós continuamos a ouvir, de alguma maneira, a voz persuasora do publicano Mateus, que, tornado apóstolo, continua a anunciar-nos a misericórdia salvífica de Deus, e escutamos essa mensagem, nela meditando sempre de novo, para aprendermos, também nós, a levantarmo-nos e a seguir Jesus com determinação.

sexta-feira, 15 de setembro de 2017

O musical do Uncle Bob

O dramaturgo e encenador irlandês Conor McPherson foi, há algum tempo, contactado por alguém próximo de Bob Dylan, inquirindo-o se estaria interessado em conceber um musical a partir dos textos do poeta. A resposta foi imediata e positiva. Passaram algumas semanas, chegou a sua casa uma caixa com todos os cds de Dylan e uma nota: "Pode utilizar as músicas que quiser, como quiser." E foi assim que nasceu o musical Girl from the North Country, um duplo revisitar do passado - o colectivo (os anos da Depressão) e o individual (o cenário de juventude de Dylan - Duluth, lá bem no norte do Minnesota, num limite dos Grandes Lagos)-, sob o signo de Steinbeck e McCullers. Diz quem viu que a escolha dos textos resultou numa continuidade coerente, sem recurso à facilidade das melodias mais conhecidas, como Like a Roling Stone que, qual fantasma, desponta apenas. Está no Old Vic e, ao que parece, o uncle Bob ainda não terá passado por lá. But... who cares?

"Daqui, deste deserto em que persisto,"

recordo, de memória, este verso de António Ramos Rosa. Talvez a propósito, aqui ficam outras palavras, as de Santo Euquério (?-c. 450), bispo de Lyon, no seu "Elogio do deserto": Será necessário acrescentar que só chegaram à terra dos seus sonhos após a permanência no deserto? Para que o povo entrasse um dia na posse da terra onde corria leite e mel, teve primeiro de passar por locais áridos e não cultivados. É sempre através do acampamento no deserto que nos encaminhamos para a verdadeira pátria. Quem quer «vir a contemplar a bondade do Senhor na terra dos vivos» [Sl 27,13] deve habitar uma região inabitável. Quem quer tornar-se cidadão dos céus deve fazer-se hóspede do deserto.

quinta-feira, 14 de setembro de 2017

Está para breve

a publicação de mais um livro meu, desta feita sobre a relação entre poesia e artes visuais. Será editado pela Imprensa Nacional, e apresentado pelos Professores Isabel Pires de Lima e Vítor Serrão. Quando a data estiver acordada, aviso neste espaço. Para já, aqui fica a capa.

quarta-feira, 28 de junho de 2017

Este lugar, este tempo...

"Si nous vivons dans ce monde, ce n'est pas pour être libres ou heureux. L'existence humaine a un but très différent. Nous vivons pour nous battre et gagner cette bataille avec nous-mêmes. Gagner et perdre à la fois. Et comprenez-le bien, nous ne savons jamais avec certitude si nous avons gagné, même si nous en avons l'impression. Comment le saurions-nous en effet? Personne ne peut savoir une telle chose. Et c'est cela qui est absurde." Andrei Tarkovski

Histórias aos quadradinhos

Os amantes da BD não devem perder esta exposição comissariada por José de Matos-Cruz, patente na Cidadela, em Cascais. A abertura foi uma oportunidade para rever um dos meus heróis, o José Garcês (na segunda foto), que foi um dos melhores amigos do meu pai, e que me conhece desde o início desta passagem. Foi também uma oportunidade para conhecer outro dos meus heróis, o Vítor Mesquita (lembram-se da Visão?) que podem ver na foto com o Matos-Cruz. Aqui fica a informação e o registo, nomeadamente dos ecos visuais de Metropolis numa prancha.

terça-feira, 27 de junho de 2017

Na edição dos Cahiers du Cinéma de

Fevereiro de 1987 surgia esta fotografia a preto e branco, com a legenda "Le três bel Adieu Portugais de Joao [sem acento, pois] Botelho, presente à Belford, qui sort le mois prochain à Paris". É, de facto, um belo filme... um dos mais belos filmes do cinema português.

sexta-feira, 23 de junho de 2017

Cuidado!

Impróprio para cardíacos: Domiziana Giordano e Alain Delon em "Nouvelle Vague". De quem? Jean-Luc Godard, evidentemente. O princípio do fim do século vinte: 1990. Bom fim de semana.

Para quem possa interessar

Cascais, no final do mês.

Breve tributo

Figura tutelar dos Estudos Americanos entre nós, com um reconhecimento internacional ímpar, Maria Irene Ramalho foi ontem objecto de homenagem na Faculdade de Letras de Coimbra. (Parabéns Isabel Caldeira, Graça Capinha e Jacinta Matos, pela iniciativa e pelo belo livro que organizaram!) A sala onde decorreu o evento, alberga cerca de dez mil livros do legado de Silva Dias. Um sinal da relevância da tradição na Universidade? Uma boa escolha, portanto. Ali estiveram discípulos e/ou colegas, da sua instituição e de muitas outras por esse país fora, jovens alunos, funcionários, para assim lhe dizerem da sua gratidão por os seus caminhos se terem cruzado com o dela. Eu, que tive o privilégio de ser interpelado pela sua inteligência e demolidor sentido de humor, desde os já remotos tempos do mestrado, em particular, na sua arguição da minha dissertação, à sua arguição do meu relatório nas provas de agregação... da sua presença no meu júri de doutoramento... do concurso para professor associado... e do concurso para catedrático... sou apenas um entre muitos que sentem essa gratidão. A ela se aplicam as suas palavras finais na cerimónia: MUITO OBRIGADO ("em letras muito grandes"), Maria Irene.

Memórias

Foi no dia 5 de Maio de 1993: o meu doutoramento. Uma aluna, clandestinamente, gravou as provas. Um amigo digitalizou agora o Vhs, e eu pude relembrar aquelas duas horas. Este é momento em que o jovem Joaquim Manuel Magalhães estava a intervir para confidenciar ter percebido por que razão não gostava de Plath: "porque ela fazia campismo." E a jovem Maria Irene Ramalho desfez-se a rir, ocultando o rosto com as mãos, como podereis ver na foto acima. Já lá vão vinte e quatro anos. À direita do vice-reitor está o jovem António M. Feijó, e, ainda mais à direita (suprema ironia!), o jovem Manuel Gusmão.

A isto chama-se "wit":

Perante a pergunta de Truffaut se a educação católica, culpabilidade e sentido de pecado tinham sido importantes para a concepção de "I confess", Hitchcock retorquiu: "Comment pouvez-vous dire une chose pareille? Mes films représentent toujours un homme innocent dans un monde coupable."

segunda-feira, 12 de junho de 2017

Twins Peaks. Em Julho/Agosto de 1991

Vincent Ostria escrevia o seguinte a propósito de Twin Peaks. Com a nova série, persiste, pertinente, o olhar: ... tout le contraire d'un film d'action: les déplacements les plus notables qui s'y déroulent sont d'ordre psychique. Car le psychisme et ses aberrations sont le sujet même de Twin Peaks. Les jeux mentaux à l'oeuvre dans ce feuilleton mènent, au bout de compte, à la poésie et à l'abstraction qui le rendent si attachant. Une poésie noire, édifiée sur la dégradation morale et la perversion.

A propósito da personagem Michael Corleone

, o ponto de vista de Coppola numa entrevista aos Cahiers em Abril de 1991: ... Michael est un personnage de tragédie, condamné. Mais ce qu'il y a d'ironique c'est que son erreur tragique est la suivante: il veut être bon. S'il n'avait pas voulu rentrer dans la légalité, il aurait pu s'en sortir ... On ne peut pas devenir bon dans un monde où le pouvoir est corrompu: et c'est ce qui le condamne à ce destin tragique. C'est un peu comme une tragédie classique.

terça-feira, 6 de junho de 2017

Ao reler velhos textos

para um livro "in progress", deparei-me com este comentário do realizador francês Yann Gonzalez a propósito deste plano de "Inferno", de Dario Argento. Leiam e digam lá se ele não tem razão? "Elle est sublime, un rien vulgaire. Les yeux perçants. Elle porte une robe de soirée et caresse un gris chat. Elle est étrangère au récit, au décor ... C'est le cinéma et lui seulement qui l'envoie. ...une apparition absurde, sexuée, le promesse d'un monde où je pourrais me réfugier en tremblant. Un monde de magie et de mort qui tiendrait tout entier dans le visage d'une femme."

segunda-feira, 15 de maio de 2017

Ainda o silêncio

Muito se falou e se disse a propósito do Silêncio e do seu significado a partir do filme de Scorcese. Deixo-vos aqui este breve apontamento sobre este tópico, colhido em Encounters with Silence, do teólogo jesuíta Karl Rahner: "Every time I try to pray, I am doomed to wander in the barren wastes of my own emptines, since I have left the world behind, and still cannot find my way into the true sanctuary of my inner self, the only place where You can be found and adored. (...) This awful quiet is the sole result of my futile efforts at prayer, since I deliberately shut out the noises of the world, and yet I an still hopelessly deaf to the eloquent sounds of Your silence."

Rua da Vergonha

é o nome do filme de Mizoguchi que acabo de ver no Nimas. Recordo que, nesta fase, até ao final de Maio, para além de Rua da Vergonha, poderemos ver A senhora Oyu e A imperatriz Yang Kwei-Fei. A propósito de Rua da Vergonha, volto a citar Bénard da Costa: "Neste filme em que não há uma cena de amor físico (apenas aquele reflexo de corpo nu naquele assombroso décor da casa de banho) tudo é erótico, porque é mortal. Ficamos-nos dele os corpos verticais das mulheres mais profundamente amadas - nunca houve 'cineasta de mulheres' como Mizoguchi - e a posição rasteira ou titubeaste dos homens mais mal tratados da história do cinema." Não percam!

quinta-feira, 4 de maio de 2017

Ciclo Mizoguchi no Nimas - A não perder

Sobre este filme escreveu João Bénard da Costa: “Pessoalmente, sustento que Os amantes crucificados é a obra-prima de Mizoguchi e um dos cinco ou seis maiores filmes da história do cinema, talvez até uma das cinco ou seis obras maiores da história da criação artística... Em metáforas ocidentais, Os amantes crucificados começa em comédias de engano e acaba em Tristão e Isolda. Passa pela luz de Vermeer, atinge a de Rembrandt (quem, senão ele, 'pintou' as sequências na cabana ao pé da casa do pai, os fenos e a luz dessa última aurora?) e termina numa das grandes Paixões renascentistas, quando nada mais se sublinha que o insublinhável.” De assinalar o catálogo que acompanha este ciclo, no qual pontua o olhar atento e culto de Bénard da Costa, como este breve passo tão bem identifica.

Uma reflexão fascinante sobre o exercício da crítica

Refiro-me a Uma aproximação à estranheza, de Frederico Pedreira, obra que recebu o prémio de ensaio Vasco Graça Moura, da Imprensa Nacional-Casa da Moeda. Com as devidas adaptações, talvez a este autor se possa aplicar aquilo que ele escreve a propósito de Mathew Arnold: "Arnold apresenta esta ideia como algo muito distante daquilo que é a crítica inglesa da sua época, uma crítica que assume propósitos e motivações exteriores aos objectos da sua atenção, com fins práticos delimitados por necessidades também elas práticas, não sendo assim fruto de uma vontade de se aproximar do melhor que é conhecido e pensado no mundo, 'independentemente de costumes, políticas e de tudo o que pertence a essas categorias.'" (p. 48)

A não perder

Paraíso, uma abordagem de profunda intensidade estética dos horrores do nazismo por parte do realizador russo Andrei Konchalóvskii. A não perder!

Caminhos

Precisamos de alimento para o caminho. Os nossos dias são abreviados com os ritmos rápidos e frenéticos em que vivemos. E só quando paramos, só quando nos detemos somos capazes de contemplar, com a largueza do nosso olhar, a beleza, a imensidão e a exigência que a nossa vida representa. Detém-te, hoje, neste olhar, e pede o único pão que te alimenta para o teu longo caminhar.

quarta-feira, 19 de abril de 2017

"Posto avançado do progresso"

Quem ainda não viu, tem hoje uma oportunidade no Monumental. By the way, sei que não está na moda, mas que tal reler "A selva", de Ferreira de Castro?

A propósito do filme de Julien Salmani

impulsionado pelo texto homónimo de Conrad, aqui vos deixo este excerto que o filme tão bem captou:The deck was a wilderness of smashed timber, lying crosswise like trees in a wood after a hurricane; an immense curtain of soiled rags waved gently before me—it was the mainsail blown to strips. I thought, The masts will be toppling over directly; and to get out of the way bolted on all-fours towards the poop-ladder. The first person I saw was Mahon, with eyes like saucers, his mouth open, and the long white hair standing straight on end round his head like a silver halo. He was just about to go down when the sight of the main-deck stirring, heaving up, and changing into splinters before his eyes, petrified him on the top step. I stared at him in unbelief, and he stared at me with a queer kind of shocked curiosity. I did not know that I had no hair, no eyebrows, no eyelashes, that my young mustache was burnt off, that my face was black, one cheek laid open, my nose cut, and my chin bleeding. I had lost my cap, one of my slippers, and my shirt was torn to rags. Of all this I was not aware. I was amazed to see the ship still afloat, the poop-deck whole—and, most of all, to see anybody alive. Also the peace of the sky and the serenity of the sea were distinctly surprising. I suppose I expected to see them convulsed with horror. . . . Pass the bottle. Repararam na última palavra? Horror, claro. Uma antecipação das derradeiras palavras de Kurtz em Heart of Darkness. Concluindo, não percam o filme. Quanto ao texto, é de fácil acesso online.

quarta-feira, 12 de abril de 2017

Antes da ceia em Emaús

como Caravaggio a concebeu, houve o encontro na estrada que São Gregório Magno (c. 540-604), papa, doutor da Igreja, na Homilia 23 sobre o Evangelho, assim interpretou: Ora, a Verdade caminhava com eles; não podiam pois continuar estranhos ao amor: ofereceram-Lhe hospitalidade, propondo-Lhe que pernoitasse com eles, como se costuma fazer aos viajantes. Mas porque dizemos que Lho propuseram, quando está escrito: «Insistiram com Ele»? Este exemplo mostra-nos bem que não devemos apenas oferecer hospitalidade aos viajantes, mas fazê-lo com insistência. Os discípulos puseram a mesa, ofereceram da sua ceia; e, não tendo reconhecido a Deus quando da sua explicação da Sagrada Escritura, eis que O reconhecem agora, na fracção do pão. Não foi pois ao escutar os mandamentos de Deus que ficaram iluminados, mas ao pô-los em prática.

segunda-feira, 27 de março de 2017

And now...

The "real thing", eg, Edgar Allan Poe´s Fall of the House of Usher:

Um eco fílmico de Poe?

A casa onde habita a simpática mãe de Norman Bates em Psycho, de Alfred Hitchcock:

Um eco pictórico de Poe?

House by the Railroad, de Edward Hopper:

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017