quinta-feira, 27 de outubro de 2011

"Dan Brown for dummies"


Foi este o comentário do meu filho Mário quando lhe resumi um dos momentos mais hilariantes de O Último Segredo, de José Rodrigues dos Santos. Qual reactualização de Parque Jurássico, agora é Ele que está prestes a ser clonado!
Deixo-vos as primeiras linhas do texto que escrevi para a Pastoral da Cultura e que poderão ler na íntegra nesse site, caso estejam interessados:

"Quando há cerca de trinta anos comecei a trabalhar na Faculdade de Letras de Lisboa, leccionei uma cadeira designada Introdução aos Estudos Literários. Era, então, consensual no meu Departamento (Estudos Anglo-Americanos), que nesta cadeira deveríamos proporcionar a descoberta dos diferentes géneros literários através de um diálogo com a História. Nesse sentido, começávamos com a leitura de textos fundadores e formadores da nossa matriz cultural, de Odisseia a Édipo Rei, de As Nuvens a O Rei Lear, para depois desvendarmos textos cronologicamente mais próximo de nós, como Mensagem ou A Terra Devastada, ou os fascinantes ecos dos poetas provençais em Ezra Pound. Dois dos textos por nós estudados no início do ano letivo, quer pela sua dimensão literária quer pela sua relevância no âmbito de uma cultura assente no logos, eram o Génesis e o Evangelho Segundo João.

Recordo o impacto que em mim teve a análise rigorosa dessa dimensão literária feita em The Art of Biblical Narrative, um livro que descobri no já distante ano de 1985, e que naturalmente partilhei com os meus alunos. Foi com alegria que vi confirmada a importância deste ensaio quando, há alguns anos, li a tese de doutoramento do padre José Tolentino Mendonça.

Através destes e doutros textos, quem passava por aquelas aulas compreendia a complexidade e a heterogeneidade dos diálogos que se foram concebendo ao longo dos séculos nos nossos horizontes culturais, e que envolviam aspectos tão diversos como a concepção cósmica clássica grego-romana, o racionalismo cristão, os ecos neo-pitagóricos no Renascimento, as convocações neo-platónicas nos Romantismos, a alquimia, o gnosticismo e esoterismos vários revisitando instantes estéticos do século XIX como a arte pré-rafaelita, e tantos outros aspectos que dão corpo à nossa identidade presente.

Recordo, por isso, que, ao ler um dos primeiros sucessos de Dan Brown, não pude deixar de pensar que qualquer antigo aluno meu identificaria as banalidades e equívocos ali exibidas; exibidas, diga-se, com o deslumbramento natural típico de quem nunca se deteve para compreender a complexidade da sua memória cultural colectiva.

Afinal, as grandes obras da cultura ocidental revisitam e questionam esses momentos fundadores, não raro numa tentativa de melhor compreender o presente em que se inscrevem. Os exemplos seriam infindáveis, por isso recordo apenas um livro de cabeceira meu, Moby-Dick. Aqui, numa aparente caça à baleia, é toda uma tradição judaico-cristã que se convoca. Da nomeação das personagens – Acab, Ismael, Elias, Raquel – às vertentes narrativas e simbólicas, essa tradição invade o romance determinando o seu rumo e até a sua resolução. Recorde-se que nas páginas inicias do livro surgem passos do Génesis, Jó, Jonas, Salmos e Isaías, e que será com uma epígrafe colhida em Jó 1 – 15 que ele termina. Neste romance, o autor, Herman Melville, exibe uma busca estética e intelectual, sustentada por uma rara erudição e por uma profunda investigação. No entanto, é com algum sentido de humor que ele entende as suas citações iniciais da História da nossa cultura como meras incursões de um sub, sub-bibliotecário. Apesar da sua erudição, o romancista/investigador exibe uma consciência face aos limites dos seus próprios conhecimentos. "

Na íntegra, portanto, em: http://www.snpcultura.org/analise_ao_romance_o_ultimo_segredo_jose_rodrigues_santos.htm

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Eles estão de volta!



Não, não é a troika! São os Stone Roses, uma banda indie que surgiu em finais dos anos oitenta e que teve uma fugaz existência mas que nos deixou algumas pérolas como "I wanna be adored" e "I am the ressurrection and the light".
A um dos seus membros, John Squire, deve-se um cd, Marshall's House, integralmente ligado ao diálogo com a pintura de Edward Hopper. Há uns tempos surpreendi um dos meus filhos, a quem devo o constante upgrade nestes domínios, lançando-lhe para cima da cama este cd... E subi uns pontos na sua consideração, claro!
Os Stone Roses farão agora uma digressão.
Passarão por Portugal?
A ver vamos!

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Estai atentos



a duas séries em exibição nos canais por cabo: uma delas, Treme, sobre New Orleans, na sequência do furacão; outra, Downton Abbey, sobre uma família inglesa aristocrática, confrontada com a emergência da classe-média, com os seus hábitos estranhos, como trabalhar, e com os conceitos não menos estranhos, bizarros, até, como o de "fim de semana". "O que é isso?" pergunta Maggie Smith, habituada que estava a que, como dizia o Morrisey, "everyday is like Sunday".
Quando estive em New Orleans há vinte e tal anos, uma residente mencionou-me uma máxima que poderá ser considerada uma versão americana da nossa o país é Lisboa, o resto é paisagem; seria ela: The US is New York, San Francisco and New Orleans; all the rest is Cleveland.
Para além do French Quarter, com a sua Bourbon Street (e o inevitável Preservation Hall, na série fechado a cadeado), não se podem esquecer os inevitáveis cemitérios (a minha geração lembrará, certamente, a cena psicadélica em Easy Rider) [referi-os aquando de uma entrevista para a DN Magazine após a catástrofe (curiosamente, o jornalista usou depois uma foto de um cemitério inundado para a capa da revista)].
Todas as tensões e mutações inerentes ao tempo da reconstrução recente, estão ali presentes.
Qualidade da HBO, a não perder!
Por seu turno, Downton Abbey surge na esteira da famosa Família Bellamy (graça portuguesa de Upstairs, Downstairs). É um cliché falar-se da qualidade das séries "históricas" britânicas. Cliché, et pourtant, verdade! E depois há a já mencionada inefável Maggie Smith que, do alto dos seus oitenta e tal anos, ainda nos assusta quando olha para a câmara (e me faz lembrar senhoras de "sangue azul" que conheci na juventude). As subtilezas dos dois microcosmos em confronto - "senhores" e "criadagem", e as tensões no seio de cada um desses microcosmos!
Embora não sendo da BBC (cliché!), aplica-se outro cliché: a não perder, também!
E por hoje basta de clichés!
Boas séries!

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Onde estava eu? Seria eu?


Não, não são questões metafísicas do tipo "quem somos?", "para onde vamos?", "o que estamos a fazer aqui?". De facto, estas eram questões muito prosaicas, pois, embora o Sr. Google dissesse que era eu, eu não era capaz de identificar o sítio nem o lugar. Quanto ao tempo, o Sr. Google dizia ser o ano 2007. Entretanto, uma leitura mais atenta esclareceu-me: era de facto eu, na Rutgers University, New Jersey (USA), a falar sobre... a relação da poesia e da teorização de Jorge de Sena com as artes visuais.
Mistério esclarecido, aqui fica a foto!

De Musset


vai ser representada a peça "Não se brinca com o Amor". Quem a leva à cena são os Artistas Unidos, com encenação de Jorge Silva Melo. A estreia, em Lisboa (Rua da Escola Politécnica) é no próximo dia 19, creio.
Sobre esta ( a peça, claro) pode ler-se no site do grupo:

1834. Musset tem vinte e quatro anos. Depois de uma febre tifóide de origem nervosa, depois das peripécias da aventura amorosa com George Sand, regressado de Veneza, irá publicar, três obras fundamentais; duas peças de teatro: Não se brinca com o amor e Lorenzaccio; e A Confissão de um filho do século, provavelmente inspirada em Santo Agostinho, ou, quem sabe, em Rousseau. Três obras primordiais que marcam uma busca inquieta de si-mesmo e dos outros: o que se passa com as nossas paixões, com os nossos sentimentos, com o amor, com a liberdade, com a verdade e com a mentira? Como é que chegámos a este ponto? Paradoxalmente, é no momento em que Musset se volta mais para si mesmo, para tentar reencontrar-se, e no meio da desordem dolorosa dos seus pensamentos que descobre uma realidade mais vasta, como se o seu horizonte, a sua paisagem mental se alargasse. Há aí como que o culminar da sua obra e da sua vida. Certas tendências dos seus escritos anteriores cristalizam-se até estabelecerem como que um efeito de ressonância entre o autor e a sua obra. Como o tema do adeus, que aqui regressa como um leitmotiv, uma sensação de que o autor não consegue libertar-se e sobre a qual fará mil variações: adeus à vida passada, à adolescência, à mulher amada, adeus ao amor, a si-mesmo, adeus.

Espero não perder!

Até breve!

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Wilfred Owen


foi um poeta inglês que, ainda jovem, perdeu a vida na I Guerra Mundial. A Wilfred Owen Association (France) está a organizar um evento junto à casa na vila de Ors onde Owen passou os últimos dias da sua vida, antes de ser morto no Canal de la Sambre a 4 de Novembro de 1918. A Associação reuniu várias traduções (entre as quais em japonês, mandarim e árabe) de um soneto seu, 'Anthem for Doomed Youth', que incluiu num panfleto que será distribuído gratuitamente durante esse evento.
A tradução para português foi feita por mim.
Ei-la, antecipando o evento:


"Hino para uma juventude condenada"

Que sinos tocam por estes que morrem como gado?
Apenas a raiva monstruosa das armas;
Apenas o soluçar rápido das espingardas
Acompanha as suas preces apressadas.
Não ouvem fingimentos; nem orações, nem sinos,
Nem vozes enlutadas, excepto os coros -
Os estridentes, dementes coros do pranto das balas,
E dos cornetins que os chamam em tristes condados.

Que velas se erguerão em seu louvor?
Não nas mãos de jovens, mas sim nos seus olhos
Cintilarão as piedosas luzes das despedidas;
A pálida tez das raparigas será a sua mortalha;
Suas flores, a ternura de resignadas memórias,
E cada lento crepúsculo, uma persiana que se fecha.

Na sequência de uma sábia sugestão, eis o texto original:


"Anthem for Doomed Youth"


What passing-bells for these who die as cattle?
Only the monstrous anger of the guns;
Only the stuttering rifles' rapid rattle
Can patter out their hasty orisons.
No mockeries now for them; no prayers nor bells,
Nor any voice of mourning save the choirs—
The shrill, demented choirs of wailing shells,
And bugles calling for them from sad shires.

What candles may be held to speed them all?
Not in the hands of boys, but in their eyes
Shall shine the holy glimmers of goodbyes;
The pallor of girls' brows shall be their pall;
Their flowers the tenderness of patient minds,
And each slow dusk a drawing-down of blinds.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Ainda Tolentino


Dizia eu ontem que a energia de José Tolentino Mendonça exigiria apenas que o buscássemos noutro lugar.

Hoje já posso partilhar convosco um desses lugares.

Basta clicar em: htpp://pedraangular-livros.blogspot.com/

Boas leituras!