sexta-feira, 2 de maio de 2014
Morava ao fundo da minha rua,
cruzavam-nos por essas bandas, no Califa ou na esplanada do Dom Giovanni. Tinha por hábito dizer-me que eu era como o Kant, pois podia acertar o relógio à hora que eu ia tomar café a seguir ao almoço. Um bom amigo e um homem de uma cultura imensa que ia despontando nas conversas que surgiam ocasionalmente. A última foi há dias sobre o Mestre Lagoa Henriques, com a Joana Vasconcelos à mistura. Tínhamo-la começado uns dias atrás, à entrada do Califa, mas ela fora interrompida por um telefonema que ele recebeu. Prosseguimo-la à porta do Dom Giovanni, enquanto a mulher do Rui Mário insistia que tinha conseguida uma mesa no Califa para almoçarem. Mas ele, claro, amador que era dessa nobre arte da conversa, insistia em introduzir algo de novo... para desespero dela. Quando há oito anos lancei o meu livro Ekphrasis, pedi-lhe que o apresentasse. Foi no Instituto Camões e o Rui Mário, apaixonado como sempre, falou mais de uma hora... Na primeira fila estava outro vulto que partiu há pouco, o Vasco Graça Moura. Há pouco passei junto ao prédio do Rui Mário e olhei para a janela do escritório, semi-oculta, como sempre, por um monte de livros. Olhara para ela quando a seguir ao almoço... Desta feita, na janela ao lado, estava uma jarra com cravos. A notícia chegou-me ao fim da manhã por um sms do Vítor Serrão: um autêntico murro no estômago! O Rui Mário?! Como é que isso é possível?! Que saudade, meu amigo! Ficamos "mais pobres e mais sós", como escreveu o Carlos de Oliveira.
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