quinta-feira, 12 de abril de 2012

A invenção de um conceito



Convido-vos, hoje, a testemunhar a invenção de um conceito.
Um momento raro nas vossas vidas, e na minha também... confesso.
Depois de Malraux ter inventado o conceito de Museu Imaginário, o qual deu título a um livro seu que muitos daqueles que têm trabalhado comigo conhecem, achei por bem avançar, também eu, com um novo conceito, o de Cemitério Imaginário.
Tal como Malraux, que para criar o seu conceito, teve de se apoiar em obras alheias, ou seja, nos artistas, também eu, para criar o meu, tive de me apoiar em obra alheia.

No meu caso, um poema de Morrisey, "Cemitey Gates".

Eis os versos iniciais:

"A dreaded sunny day
So I meet you at the cemetry gates
Keats and Yeats are on your side
A dreaded sunny day
So I meet you at the cemetry gates
Keats and Yeats are on your side
While Wilde is on mine"
Ora, como se sabe, Keats jaz, num equívoco anonimato ("here lies he whose name was written on water", cito de memória as inscrições na lápide), no cemitério não-católico (prefiro esta designação a "protestante", já que lá também estão enterrados judeus... só se o estiverem sob protesto) em Roma, Yeats na Irlanda (St. Columbus's Church), e Wilde no Père Lachaise, em Paris.
Portanto, tal como Auden, em "Musée des Beaux Arts", "coloca" na mesma sala quadros de Brueghel que se encontram em museus distintos, também Morrisey coloca no mesmo espaço gente que obviamente vive fisicamente a eternidade em espaços distintos. Conclui-se que Morrisey recorreu aqui ao não muito eliotiano correlativo para afinal enunciar paixões/opções estéticas et al.
Deixo-vos um testemunho meu, junto ao túmulo do meu colega Keats, em Roma, há uns anitos, assim como uma imagem do controverso túmulo de Wilde. Estive junto a ele há umas semanas (depois de, à semelhança de uma legião de adolescentes americanas, ter ido visitar o Jim Morrison) e constatei que tinham introduzido uma protecção em acrílico já que os que, como Morrisey, estão on Wilde's side persistiam em beijar o túmulo. Agora, pude testemunhar, com estes dois que o forno crematório há-de incinerar (versão pós-mó do "que a terra há-de comer"), os/as devotos/as beijam o acrílico.
Assim termina este momento histórico!
Enjoy!

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