segunda-feira, 13 de novembro de 2017
Uma obra acabada de sair
Refere Woody Allen num filme (não me lembro qual) que o seu psicanalista era um freudiano ortodoxo. Significava isto que, mesmo que ele se suicidasse, tinha que continuar a pagar as sessões. Ainda que radicado em Freud, Orlando Fialho, um dos mais reputados psicanalistas da nossa praça, está bem longe do analista de Allen. A sua obra acabada de vir a lume, com a chancela da Colibri, tem por título Psicanálise - Sujeito e objecto na cura analítica, e foi apresentada em Lisboa no sábado passado ao final da tarde (uma alegria rever Orlando Fialho trinta e tal anos depois!). A obra reúne um conjunto de conferências realizadas ao longo do tempo, o que não significa uma ausência de coerência e de unidade no percurso analítico, com continuados regressos a Ogden, Bion e a Winnnicott (e a Freud, claro), passando por Alberto Caeiro e Monet. Aprecio, entre outras coisas, o modo como o analista se revela na sua fragilidade do encontro com o outro, e a consequente convocação de conceitos como "entre" e "inter-subjectividade", "resto", "caos" e "vestígio". Porque já o li, recomendo a quem reconhece que pode aplicar-se a si próprio o comentário de Bion: Eu esforço-me por ver outra coisa, por me abrir a outra coisa - aos vestígios, aos vestígios mentais. (...) O que é evidente, é evidente, não há nada mais a dizer. O analista deve libertar-se das suas recordações e dos seus desejos, de forma a poder abrir-se ao presente. A psicanálise dá a impressão - correndo o risco de nos induzir em erro - que o que importa é o passado, na medida em que nos faz acreditar que o importante em psicanálise é o passado. No entanto, o passado não é importante, porque relativamente a ele não podemos fazer nada. As únicas coisas às quais podemos ter acesso são os restos, os vestígios do passado, os vestígios de estados de espírito do passado ou de componentes arcaicas do nosso físico... (Fialho, 2017: 59-60) Enfim, uma reflexão que pode ajudar-nos a compreender(-nos)... a nós que "vivemos permanentemente num caos psíquico" (idem, 59).
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